Prefeitos derrotados punem eleitor em Pernambuco
Sem perspectiva de poder, gestores deixam de prestar serviços básicos, constatam Ministério Público e TCE
O Globo
Recife - Além da falta de empenho para incrementar a receita dos seus
municípios há cidades onde a prefeitura não recolhe um centavo sequer de
IPTU , prefeitos não reeleitos ou em final de segundo mandato estão
demonstrando total descaso em relação a direitos e deveres que
caracterizam a cidadania. A lista é extensa: suspensão de serviços
essenciais (como saúde e transporte escolar), demissões irregulares, calote na folha de pagamento dos servidores concursos públicos, nomeações de última hora e desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) são exemplos do que vem ocorrendo na Zona da Mata, no Agreste e no Sertão.
Esses prefeitos já se encontram na mira do Ministério Público de
Pernambuco e do Tribunal de Contas do Estado (TCE), que firmaram
parceria para evitar que a população sofra tantos prejuízos:
O que se observa é que os prefeitos se
voltaram contra a população porque não foram reeleitos ou não
conseguiram fazer os sucessores. Por perversidade, suspendem serviços
básicos ou essenciais que vinham sendo normalmente prestados até o dia
da eleição. Relaxam na limpeza pública, exoneram professores,
atrapalhando o calendário escolar, suspendem o transporte de alunos da
rede municipal, e até chegam a propor que os servidores trabalhem como
voluntários, na esperança de serem recontratados pelo próximo prefeito.
Alguns, quando saem, destroem toda a documentação e zeram os
computadores para o sucessor afirma o coordenador do Centro de Apoio
Operacional às Promotorias de Defesa do Patrimônio Público, Maviael de
Souza Silva.
Há 17 anos atuando nesse setor, ele já chegou a pedir mandado de busca e
apreensão para resgatar documentos subtraídos das repartições. Ou seja,
o problema é antigo, mas ainda surpreende a presidente do TCE, Tereza
Duere, para quem o abuso piorou.
Sinceramente, não esperava encontrar uma situação dessa. A impressão que
a gente tinha era que as autoridades amadureceriam com a democracia.
Mas não é o que está ocorrendo. Estamos no pior momento da transição.
Nunca vi tantos prefeitos que perderam abandonando irresponsavelmente
seus cargos. Confesso que nunca havia presenciado esse problema na vida
pública de forma tão intensa. É como se os derrotados estivessem se
vingando da população. Eles nos dão a impressão que pensam que o
patrimônio público é deles e, de repente, sentem que ele está sendo
arrancado afirma.
Até a última quinta-feira, o TCE já expedira 24 medidas cautelares
impedindo prefeitos em final de mandato de realizarem concurso públicos,
promoverem nomeações de concursos improvisados e exigindo cumprimento
da LRF.
Cidade ficou sem médicos e transporte escolar
Ministério Público de Pernambuco entrou este ano com 45 medidas contra
prefeitos: são termos de ajustamento de conduta, bloqueios de conta,
ações cautelares e preparatórias de ações civis públicas.
O caso mais emblemático foi o da prefeita Elizabete Maria Silva de Lima,
a Bete de Dael (PR), de Bezerros, a 107 quilômetros de Recife. Ela
demitiu médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem, agentes
comunitários de saúde e combate a endemias, profissionais ligados ao
Programa Saúde da Família e auxiliares do transporte escolar.
Todos trabalhavam em regime de contratação temporária, com vigência até
este mês, e foram demitidos verbalmente. Denunciada pela população, ela
se recusou a atender à recomendação do MP para restabelecer os serviços.
Foi afastada pela juíza Christiana Caribé, da 2ª Vara de Bezerros.
O ex-presidente da Câmara dos Deputados Severino Cavalcanti (PP),
prefeito de João Alfredo, também foi alvo do TCE e do MP. Precisou
assinar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para regularizar o
pagamento dos servidores e restabelecer os serviços públicos. Segundo o
MP, o prefeito pagava aos fornecedores, mas não aos servidores. Ele
desistiu de disputar a reeleição, por ter caído na Lei da Ficha Limpa, e
não conseguiu eleger a aliada, Ana Mendes (PSDB).
Contas bloqueadas
As contas da prefeitura foram bloqueadas. A Justiça só as liberou depois
que Cavalcanti firmou um TAC, comprometendo-se a restabelecer os
serviços de educação e saúde, o fornecimento integral e regular de
remédios e o transporte para pacientes que precisem de tratamento em
Recife. Caso descumpra o TAC, Cavalcanti pagará multa diária de cinco
salários mínimos.
Como Bezerros e João Alfredo, mais de 20 municípios foram advertidos
pelo MP para restabelecer os serviços públicos. Outros, para garantir a
transição sem sonegar informações. O problema já motivou uma reunião do
Fórum de Combate à Corrupção de Pernambuco.
O presidente da Associação Municipalista de Pernambuco, Jandelson
Gouveia (PR), prefeito de Escada, foi procurado para responder pelos
seus colegas, mas não retornou as ligações. Para evitar que o problema
se alastre, o TCE e o MP expediram recomendações para os prefeitos,
alertando que sejam observados os preceitos da LRF e criadas comissões
de transição com os futuros prefeitos.
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